Apelidos galego-portugueses que fôrom castelhanizados

No presente artigo farei referência a alguns apelidos galego-portugueses, mas que no nosso país padecêrom a castelhanização. De facto, nos dias de hoje, alguns deles são mais reconhecíveis pola sua forma portuguesa, que não deixa der a genuina galega.

  • Afonso. O Zeca Afonso, grande amigo da Galiza e do povo galego, talvez foi (e ainda) é o Afonso mais conhecido. A Cartografia dos Apelidos da Galiza (CAG) contém 881 ocorrências do apelido face às 2086 de Alfonso ou mais de 43.000 de Alonso.
  • Branco. Face aos 46.058 Blanco que recolhe a CAG, só encontrámos 20 Branco. Em Portugal houvo um famoso portador no escritor Camilo Castelo Branco.
  • Caeiro. O ex-fubolista Figo é, se quadra, o mais conhecido portador deste apelido (Luís Filipe Madeira Caeiro). A CAG recolhe 994 ocorrências deste apelido, mais trinta da variante Cairo, frente a 78 da forma deturpada Calero. Precisamente, um dos vultos do reintegracionismo, Ricardo Carvalho Calero, nunca chegou a restaurar o segundo apelido para a forma legítima (todos temos as nossas contradições, pensarão, mas consultem também a nota bene). Como curiosidade, a CAG recolhe sete (7) Caleiro no concelho da Bola…
  • Costa. O primeiro ministro português, António Costa, é um reconhecido portador deste apelido (que também existe na língua catalã). A CAG indica 8432 ocorrências deste apelido frente a 443 ocorrências para a forma deturpada Cuesta.
  • Guterres. Com mais de cinco mil ocorrências, é um dos apelidos galegos mais difundidos, mas todos eles na forma deturpada Gutiérrez. A CAG recolhe zero (0) Guterres na Galiza. Em Portugal temos muitos Guterres com sona, como António Guterres, ex-primeiro ministro português e atual secretário-geral da ONU.
  • Lourenço. A CAG apenas recolhe 45 Lourenço, que provavelmente serão de origens portuguesas. A forma deturpada Lorenzo ascende a 29.130. Como curiosidade, não há referências a qualquer Lourenzo (grafia ILG-RAG). Levam o apelido a atriz brasileira Sílvia Lourenço ou a bailarina portuguesa Catarina Lourenço (filha do poeta e filósofo Manuel António dos Santos Lourenço, mais mais conhecido por M. S. Lourenço). O mais famoso Lourenço galego é, sem dúvida, o bem-prezado (aliás, ourensano) Vítor Lourenço.
  • Maia. A CAG regista só 33 ocorrências de Maia, que está no lugar 80.º dos cem apelidos portugueses mais comuns, frente a 165 da forma deturpada Maya. Somadas ambas as duas, dá-nos um futuro pouco promissor para este apelido na Galiza. O compositor brasileiro Sebastião Rodrigues Maia (Tim Maia) é atualmente um dos mais famosos portadores do apelido.
  • Martins. Ainda que Gallaecia Monumenta Historica (GMH) recolhe vários Martins ou Martis (como já vimos), na atualidade trata-se de formas residuais, com 739 e 202 ocorrências, respetivamente, na CAG. Porém, a forma deturpada Martínez tem mais de cem mil frequências… Um Martins conhecido foi o franco-português Corentine Martins da Silva, ex-jogador do Dépor e atual selecionador da Mauritânia.
  • Monteiro. Apelido que ocupa o 28º lugar entre os mais frequentes de Portugal e mesmo dá nome a um município brasileiro, tem 625 representantes na Galiza face aos 8671 com a forma deturpada Montero.
  • Neves. Apelido que ocupa o 31º lugar entre os mais frequentes de Portugal; porém, só 50 na Galiza por 1488 da forma Nieves. Daqui a uns anos, talvez seja conhecido polo jovem futebolista português Rúben Neves.
  • Ribeiro. Com 6718 ocorrências, é um dos apelidos galegos mais frequentes, embora 88% o grafam Riveiro. As formas deturpadas Rivero ou Ribero atingem as 2900 ocorrências.
  • Sarmento. Na história portuguesa há inúmeros Sarmento, os mais deles vinculados a uma família nobre com origem em Trás-os-Montes. A CAG recolhe zero (0) Sarmento na Galiza frente a 787 Sarmiento. Precisamente, na forma deturpada, foi conhedido o padre Sarmiento (que bem devêramos chamar Sarmento), nascido Pedro José García Balboa (Pedro José Garcia Valboa, na ortografia moderna).
  • Soares. Com esta grafia não é um apelido desconhecido na nossa história (consultem na GMH), mas atualmente só há 228 ocorrências na Galiza. A forma do apelido coincidente com a castelhana, Suárez, tem mais de trinta mil… Um conhecido Soares tinha de nome Mário e foi presidente da República Portuguesa.
  • Sousa. Felizmente, a forma deturpada Sosa é muito infrequente na Galiza (99 ocorrências na CAG), geralmente localizada só em cidades, o qual pode dever-se a que fosse trazida por uma recente imigração da América latina, onde é um apelido popular. O apelido Sousa tem 3856 ocorrências, ao tempo que a forma Souza (popular no Brasil) tem 213. Um moderno portador do apelido Souza é o galego Ernesto Vásquez Souza (a quem aproveito para saudar), só um pouco menos famoso que o ex-futebolista Romário (Romário de Souza Faria).
  • Tavares. A CAG não permite discriminar as pesquisas por acentos, portanto a afirmação que farei pode não ser precisa 100%, mas a experiência diz que boa parte dos  Tavares galegos têm atualmente o seu apelido como Tabarés. A CAG recolhe apenas 65 Tavares (provavelmente de origem portuguesa, o que lhes permitiu salvar a forma original) e 185 TABARES, que figuro serem Tabarés antes do que Tabares (ao menos ena maior parte dos casos). Esta mudança na posição do acento acontece também com o apelido Nóvoa, usualmente grafado Novoa ou Noboa. Atualmente há duas conhecidas Fernanda a levarem o apelido: a modelo brasileira Fernanda Tavares e a jornalista galega Fernanda Tabarés.
  • Vaz. Está no número 79 dos mais frequentes em Portugal, mas na Galiza vai caminho da extinção. A CAG recolhe 839 formas Vaz e ainda 842 Baz. Com a grafia deturpada está vivo sobretudo no Baixo Minho e área metropolitana de Vigo, zonas demograficamente vivas que contribuirão em certa medida à sua preservação. Porém, a forma genuina Vaz está viva especialmente no sul da província de Ourense, zona demograficamente deprimida, polo que em poucos anos o apelido Vaz será quase uma lembrança longínqua. Disque o poeta português Luís Vaz de Camões era de origens galegas… Bela metáfora!

BONUS TRACK

Alguns apelidos genuinamente galegos, sem peso em Portugal, e que na Galiza fôrom exterminados (ou quase):

  • Afonsim. Apelido da família de Afonso. Mas, ao contrário deste, desaparecido da Galiza, segundo a CAG. Atualmente só resiste a forma deturpada Alfonsín.
  • Deus. Tem 892 ocorrências na CAG, menos da quarta parte que Dios (4082).
  • Outeiro. A CAG dá 291 ocorrências para este apelido, muito longe das 45.558 de Otero. Curiosamente, o apelido derivado Outeiral tem muita melhor saúde, com mais de 1200 aparições.
  • Preto. Embora GMH recolhe várias ocorrências do apelido Preto, na atualidade só se regista Prieto, com mais de 14.000 ocorrências na CAG.

NOTA BENE: Quem tiver um destes apelidos na forma não-galega, com grande probabilidade tratará-se de um apelido deturpado, mais ainda se não se conhecer origem familiar estrangeira, sendo recomendável a troca do mesmo para a sua forma legítima. Só num reduzidíssimo número de casos a posse do apelido será devida a origens familiares não-galegas que não aconselhariam a troca.

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