Marea(ndo à) Galega

Confluir
v. i.

(1) Ir dar ao mesmo ponto. ≃ convergir, concorrer, afluir

(2) Ajuntar um rio as suas águas às de outro: o Tea conflui com o Minho na paróquia de Arentei.

(3) Med. Unir-se ou acumular-se (manchas ou vesículas eruptivas).

[lat. confluere]
http://www.estraviz.org/confluir/

No momento de redigir estas linhas, está quase confirmado que nas eleições às Cortes espanholas de 20 de dezembro de 2015 haverá, no mínimo, duas candidaturas galegas. Uma, por quase-confirmação, será uma espécie de Alternativa Galega de Esquerdas (AGE) alargada, uma AGE II em que se situariam Podemos, IU-EU e Anova, explicou um dos porta-vozes desta última, Martiño Noriega, ao tempo que assinalava que «as portas» não estavam ainda «fechadas» para o BNG.

Ante isto, três cousas.

PRIMEIRA COUSA. O facto de se falar de «portas» implica, pois, a sua própria existência. As portas podem ficar abertas ou fechadas. Se uma porta fica perennemente aberta, não faz sentido a sua existência —é um elemento inútil—, portanto o próprio motivo da sua existência é fechá-la nalgum momento. Reiterar que não estão fechadas parece a clássica excusatio non petita, e não creio que seja algo casual, mas meditado.

SEGUNDA COUSA. Uma voz autorizadíssima de Anova —e pessoa pola qual, ademais, sindo um profundíssimo respeito pessoal, embora muitas vezes (como neste caso) estejamos em discordância plena— confirma o que muitos levávamos tempo a dizer. Confirma, em definitiva, que haverá uma candidatura cozinhada de riba, como a política de sempre. E não me parece mal que assim seja. Mas, por favor, deixai de lado a retórica da «confluência cidadã» e da «unidade popular». É política de sempre: política partidária, de organizações que somal forças e estruturas. É um acordo por riba que se referendará por baixo —como sempre, também— para criar a fantasia de ser fruto do desejo popular. É velha política, insisto, e não me parece mal.

TERCEIRA COUSA. Ao se quase-anunciar um acordo a três e em base a critérios, propostas, princípios, etc., que ainda nem conhecemos, é muito provável também que um quarto elemento ’em discórdia’, o BNG, se recuse a entrar. Seria o mais comprensível, já que a lógica de uma confluência é as diferentes partes chegarem a um consenso simultâneo, não três delas (e de maneira privada, não pública) chegarem e convidarem/instarem uma quarta a confluir com ela.

Cuido que entramos no ato final de uma grande obra teatral em que se pretendeu enganar o público desde o começo e com três grandes atores e atrizes:

I. As organizações integrantes da AGE II, com vontade de criarem uma candidatura na linha da AGE original —mas alargada—. Uma candidatura feita de acima para abaixo, mas cuidando algumas formas para criar a ficção de ser de abaixo para acima. Uma candidatura em que o elemento nacional galego ficaria num segundo plano —quando não abandonado—, centrando-se apenas na parte mais social da problemática atual.

II. O BNG, sem vontade real de chegar a um acordo com as organizações anteditas, especialmente com Anova. «Com Esquerda Unida e Podemos, quererás dizer!». Não, com Anova. Porque as feridas da rutura pós-Âmio ainda não sararam, especialmente no que diz respeito de relações pessoais. Somos um país com tão pouco sentido de país que deixamos que inimizades/(des)enganos pessoais se imponham ao sentido de país.

III. As galegas e galegos de esquerdas e com sentido de país que realmente acreditavam na possibilidade de uma candidatura unitária e perderam tempo e fôlegos promovendo atos informativos, fóruns de debate e outras iniciativas para criar o pouso necessário que levasse a nave nesse rumo.

CONCLUSÕES

  1. Depois de todo isto, as conclusões dalgumas vozes serão que não houve candidatura única por culpa do BNG, por se excluir. Outras dirão que o BNG não tem culpa, porque o excluíram. Na minha opinião, a culpa é dos atores e atrizes antes sinalados, de todos e de todas sem excepção. Ninguém é inocente, embora é claro que a maior parte da culpa é das organizações partidárias, pois ao público só se lhe pode reprochar ter acreditado que era possível fazer as cousas doutra maneira. Mas, sabeis o mais triste? O mais triste é que as cousas sim podem ser doutra maneira. Só que ainda não é o momento.
  2. O de confluir é algo mais próprio de rios que de rias. Vamos, não parece algo adequado às marés.

 


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