A nossa rede não é nossa, é estadounidense

Estando como estamos num momento de aparente liberdade para a comunicação na internet, e sendo como somos conscientes da importância desta ferramenta para o progresso das liberdades e a difusão do conhecimento, poucas vezes paramos a reflectir num dramático facto: que toda esta panaceia, esta utopia, este veículo de comunicação social, não nos pertence a nós, mas aos estadounidenses.

Embora por hoje eu pareça adoecer de uma teima contra os EUA (ver o post anterior), nada mais longe da minha intenção. O que venho a recuperar aqui é a necessidade de não perdermos a perspectiva de que, apesar de tudo, constituimos a periferia de um império cujas raízes poucas vezes vemos.

O último exemplo derivado dessa ausência de soberania mundial sobre a rede vimo-lo na decisão da ICANN (Corporação da Internet para a Asignação de Nomes e de Números) de não admitir o registo dos domínios .xxx, que seriviriam para identificar as páginas pornográficas (muitos galegos lembramos os poucos escrúpulos de algum registrante que associou um destes sítios a um nome que evoca a capital galega).

O que passou? Que a ICANN, dependente do Departamento de Comércio dos EUA, à sua vez pressionado polos grupos mais conservadores, fijo tudo o possível por impedir que a iniciativa tirasse para à frente.

E volvemos ao eterno debate: onde é que deve localizar-se a sé da internet? Num país ultraconservador como os EUA, na velha Europa ou nas emergentes potências asiáticas? Desde logo, todos sabemos do perigo da fragmentação da rede, mas também estamos vendo o perigo da sua localização.

Parece que o caminho mais lógico passa por uma soberania compartilhada das decisões, talvez pola ONU (se este organismo funcionasse como é devido, quer dizer, se os EUA não fossem onipontentes no seu seio).

Pode parecer anedótico o facto do fracasso do .xxx, mas reparando nas questões de fundo e atendendomos à relevância da rede, é evidente que o tratamento que se lhe der a esta questão não é um facto menor.


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