O bolsonarismo é terrorismo

A tentativa de golpe de Estado no Brasil, nem é uma brincadeira nem surgiu do nada. É o retrato de um governo criminal, de inspiração teocrática e apoiado em torturadores e assassinos.

Nos meses prévios às eleições, todos os inquéritos davam por derrotado Bolsonaro, cujos índices de popularidade se arrastavam já polo chão. Com as sondagens situando o seu patamar de votos abaixo de 30%, ele chegou a afirmar que «em eleição limpa, tenho certeza de que ganharemos com no mínimo 60% dos votos».

A sua estratégia eleitoral girou em base a agitar o medo frente às políticas que poderia pôr em andamento o seu adversário, em divulgar falsidades —desmentidas decontado por parte da imprensa crítica— e em espalhar boatos sobre a votação eletrónica —que em 25 anos demonstrou ser eficaz e segura.

A sua estratégia deu o fruto certo: polarizar ao máximo a sociedade brasileira, fragmentando-a em dous blocos irreconciliáveis e deixando pouco espaço para posições mornas. Isso garantiu-lhe chegar com possibilidades à segunda volta.

Esse dia, o bolsonarismo mobilizou-se polas vias legais e as ilegais, causando funda indignação social a atuação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), realizando controlos de trânsito nas localidades mais favoráveis ao Lula, provocando engarrafamentos de várias horas.

Esta manobra, proibida expressamente polas autoridades eleitorais, obrigárom o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a intervir e implicitamente ameaçar com processar os mandos policiais que incumprirem as ordens.

As manobras sujas, porém, fôrom infrutuosas e Bolsonaro foi, afinal, esmagado com clareza.

Lula, o ex-sindicalista, o ex-presidente, o ex-presidiário, regressava das suas cinças. Livre das falsas acusações que o levaram ao cárcere, convertia-se no primeiro presidente democrático em voltar ao poder. E Bolsonaro, também, convertia-se no primeiro a não conseguir a reeleição.

Mais de meio milhão de mortos depois de uma gestão criminal da pandemia da covid-19, parecia que o bolsonarismo chegava ao seu fim. Mas ainda não. A patir da proclamação dos resultados por parte das autoridades eleitorais, começou um longo silêncio e a ausência do reconhecimento da vitória do Lula. O covarde Bolsonaro convertia-se, daquela, no primeiro presidente desde a restauração da democracia que não reconhecia uns resultados.

O silêncio explícito foi, porém, uma ordem implícita para os seus partidários se mobilizarem. Começou aí uma dura greve de caminhoneiros que pretendeu paralisar o Brasil, inclusive com protestos diante de instalações militares exigindo o exército tomar as armas. Pessoas influentes de distintos setores sociais, especialmente da igreja evangélica, alimentárom o apoio a um golpe de Estado, como por exemplo o ex-futebolista Donato Gama da Silva.

Durante semanas, o Governo brasileiro em funções deixou via livre aos exaltados bolsonaristas para tomarem as ruas, sendo o poder judiciário —através da Procudoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal— a exigir o restabelecimento da ordem, ameaçando com processar criminalmente as autoridades e mandos policiais cúmplices com o bloqueio do país —aqui destaca o nome de Silvinei Vasques, bolsonarista militante e na altura diretor-geral da PRF.

Com estes precedentes faz mais sentido do que nunca que, a 30 de dezembro, Bolsonaro abandonasse o país rumo aos EUA, supostamente para umas férias. Convertia-se, outra vez, num caso inédito: o primeiro presidente a não dirigir a transição e a não entregar a faixa presidencial ao seu sucessor desde o restabelecimento da democracia.

Dous dias depois, a 1 de janeiro, produzia-se a tomada de posse do Lula como presidente e a dia 8 produzia-se a tentativa de golpe de Estado.

A cronologia acima descrita é a maior prova de que o golpe não surgiu do nada, mas de uma estratégia à desesperada, fracassada, mas com apoios que chegam a altos níveis. Conhecedor de que uma logística como essa precisa financiamento, o presidente brasileiro advertiu que chegarão aos financiadores do golpe e serão punidos.

Ficam muitas dúvidas acerca das possibilidades reais de localizar e punir os ideólogos e financiadores da revolta violenta. Porém, do que há poucas dúvidas —se é que existia alguma— é de que o Lula vai ter um mandato presidencial muito complicado. Se um dos seus principais objetivos era sarar as feridas e suturar um país dividido, estes factos demonstram a magnitude e dificuldade da tarefa. Mas se alguém o pode conseguir, será ele, que logrou várias vezes o que parecia impossível.


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